❤Autoria: Diana Conrado
A luz do dia já havia se despedido. Rita cansada, com fome, ajeitava sua cama de papelão nas escadaria da Catedral.
A mendiga de 45 anos, viúva, levava tudo que tinha em um saco sujo, um mundo bem distante para muitos, guardados ali sofrimentos, talvez, nunca imaginados por nós, mas também, lá estavam muitos sonhos sufocados. No saco, iam não só os seus pertences, mais a vergonha, o desprezo e tudo que era importante para si. Por ombros dados, seguiam as suas petições negadas.
O sino soava a segunda badalada da noite natalina, enquanto isso, a mulher movida por sua ávida fé, cálida, ainda procurava se instalar nas escadarias, na espera de receber um pão para o saciar da sua carne e ouvir as palavras de milagre do nascimento de Jesus e fazer despertar em si a esperança em Deus.
Uma época, cuja, a função é fazer os católicos crerem na vinda de Jesus em condição de Filho de Deus. Rigorosamente, cumprem como um mandamento que, o qual, não se tem tal notícia nas escrituras sagradas do dia e ano em que houve o nascimento do Cristo. Mesmo aqueles que não são cristãos, entram nesse barco e, como mágica, neste dia específico, todas as desavenças, as desigualdades de classes, ficam de fora, permanecendo nos corações, como um grande coral, a polifonia do amor e da caridade. Da mesma forma estava ali aquela mulher, sem murmurar, ansiosa, ouvia o desespero das buzinas e os barulhos das cozinhas, acompanhados pelo som dos capitalistas sanguinários que baixavam as portas de suas fortunas, quase na última cantada do galo.
No semáforo, uma voz lastimável carregada de um tom cristão, chama a atenção não só dos ouvidos de Rita, mas também de seus olhos incuráveis:
___Irmãos e irmãs, sou filho de Deus como vocês, e nessa noite de festa cristã, motivo pelo o qual me traz aqui, suplico por sua caridade para que me ceda de alimento, pois não possuo nenhum igualado ao que será ceado no banquete da mesa natalina: que sacia a a alma, o corpo e o espírito.
E tão logo, foi interrompido pela aparição de um confessado cristão entregando àquele homem, dinheiro e algo para se fartar.
Nesse instante, os olhos de Rita se transbordam de fé e confiança para um natal esperançoso e um ano novo de alegria.
Logo, muitos carros vão se achegando e estacionam na praça da Catedral. Crianças, jovens, adultos e velhos surgem no tapete cristão vermelho, com suas cabeças esguias, levando sobre o pescoço crucifixos que fazem pender os olhos e os corações a verdadeira e única simbologia da comemoração: amar o próximo como a si mesmo.
Nesse momento, as ágios mãos de Rita se estendem para cear e, alguns dos cristãos, comovidos, mexem nos seus bolsos, uns bem generosos, outros mais ponderados e, ainda, aqueles que manifestam uma mísera singeleza. Porém, todas as moedas aguardavam por este importante momento complacente, e sem demora, os tinidos dos metais chegam para as mãos da fidedigna mulher.
Mais uma vez, a esperança invade o coração daquela mulher, mesmo sem conhecimento de causa, caminha para as Catedrais todos os anos, crente que será bem recebida por sua família, saciando-se da sobra de um ano desigual, e ambos, sem compreender se tal dia é o que é, seguem pelo mesmo impulso, em destino para romaria celestial. De um lado os eternos fantasmas errantes em busca da efêmera felicidade, e do outro, corações caridosos declinados ao semelhante, que tanto sofrem, mas, que após um ato de bem, esses corações enfim gozarão por sua redenção. Dogmatizados pelo dia em que nasceu o menino, tal qual, é hoje o Cristo, que sofreu, morreu por seus ensinamentos e sonhos trazidos à terra, mas que ninguém, verdadeiramente, entende e recebe a significância da Sua vinda.
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